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rosário
rebello de
andrade
30 de Janeiro de 2024
Ali
no centro
está uma pérola
metáfora
simboliza algo
ou alguém?
ou pérola que
até sempre
se procura?
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6 de Julho de 2021
quando era adolescente
desenhava muito
escrevia poemas
a minha irmã mais velha
sem me perguntar
vinha e roubava-os
para mostrar ao namorado
ele dizia-me
que eu tinha talento
para quê pergunto-me
se não guardo hoje nenhum
desses poemas
dos desenhos de criança
também não
entulho junto ao entulho
dos meus irmãos
foi tudo parar ao lixo
e assim algo de mim
também foi
hoje escrevo poemas
e faço desenhos
e penso o meu imaginário
e vejo a natureza real
das coisas que são e não são
e sou como esses poemas de então
pois também eu sou a natureza
guardo ou deito fora
oculto conscientemente
ou não
nunca sendo e não sendo
ao mesmo tempo
uma parte de mim por vezes é
ou não é
a outra guardo-a comigo
e junto-a à natureza
toda de uma vez
é preciso recuar à infância
para entender
na verdade poderia ser
a infância de qualquer outro
única e individual
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17 de fevereiro 2022
Embora escreva
os dias dos meus
passos tantas vezes
tresmalhados
de quem sofre
ou muito ama
não sei se ser poeta é isto
contudo
se ser poeta é
quando os meus
passos percorrem
a direção extraviada
dos ventos
ou do pássaro
ou da árvore
que cresce no meu jardim
interior
ou de qualquer outra
árvore na cidade
que para dar cor
e sentido
ao burburinho
dos sons das ruas
agitadas me dirigem
o erguer do olhar
na direção
do infinito
podendo assim
regressar ao âmago
do mais íntimo
desejo
e mais profundo
e universal
de tornar-me
num encontro
transcendental
Então que seja poeta
Sempre
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Há dias em que estou triste
e vejo o cinzento das ruas
e do céu e do chão
e de tudo quanto piso
E sinto uma gratidão
enorme por estar
viva e poder sentir
o sentir assim
Não sei porque escrevo
ou pra quê
só sei que não vivo
sem a escrita
no meu pensamento
Pensar é percorrer
caminhos insondáveis
descobrir-me no outro
e entregar-me
As sombras dos caminhos
ou as luzes
desde o cair da folha
ao desabrochar do lírio
do cintilar da luz
à explosão da Estrela
que há em nós
são o universo
inteiro
seja isto que escrevo
uma oração
o implorar da vida
que à nascença
se afirma
o mais ínfimo
no outro e em mim
e na natureza
existe
e é tão grande
como o universo
em expansão
em todos os estados
te desejo
em ti genuinamente
me completo
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Leio Fernando Pessoa
e revolvem-se-me
as entranhas
é todo um sentir
por dentro
sigo Alberto Caeiro
como uma oração
completa
e incompleta
pregação
na sua prece
simultaneamente
me completo
mas ainda não sou inteira
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29 de Maio, 2022
meu Deus
quando sinto
o que me rodeia
neste mundo
cansado e doente
tenho vontade
de te pegar
na mão
e rezar contigo
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27 de Julho de 2022
Quero que o
meu dia seja
hoje todo
uma oração
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Ontem ao levantar vôo
no avião comecei a sonhar
de olhos fechados,
como se faz numa oração.
Soletrava as palavras
como se as minhas mãos
as escrevessem em voz
alta no meu cérebro.
Podia vê-las
pontuava-as
com as vírgulas, os pontos,
os parágrafos.
Falava com Deus
e com a Virgem Maria
em discurso directo
sentindo-a como
a minha Mãe
verdadeira
e não a substituta
da minha nesta terra.
Falava-lhe de mim
do outro
de todos os outros
sentia uma luz
pacificadora
e dizia como esta é
uma oração verdadeira
como tudo se cumpriria
se há de cumprir.
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Atravessando uma ponte em chamas
Num labirinto perdida
no meio de obras
de arte
ocupavam todo o meu espaço
roubavam-me
só quiz fugir.
Corri.
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Lisboa, 26 de Junho de 1995
leio-me (de mim) para mim e reconheço-me várias
vezes. de cada vez vejo um mim
distinto de outro mim. todos os mins
que me leio formam um só. nenhum
deles poderia sobreviver isolado.
é na distinção que possuem
entre eles que faz com que vigorem,
sendo eu.
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25 março 2023
não sei se vivo num Mundo sonhado
ou em dois mundos paralelos
um é o meu
que crio e me faz viver
o outro o da crua realidade
o primeiro concede-me
a paz no Interior o segundo
sofre-se do exterior
porém o mundo
exterior
não pode deixar de
penetrar o interior
dois mundos separados
juntam-se no tempo
e no espaço
no primeiro vivo-me
no outro sofro-me
sonhando flutuo
no extenso mar
por cima observam-me
os astros
afirma-se a escrita
cercadas as letras
no infinito
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Nobembro 2021
quando o sonho vivo
é vida que vive
e olho os caminhos
em mim já não é sonho
visões soltas
na realidade dos meus passos
e quando tropeço
um dia morrerei
os outros e as coisas
apr(e)endidas
e ficam os átomos
nada é efémero
o outro as coisas
átomos dessoutros
são cruzamentos
existenciais
não quero ser grande
não quero ser nada
para cada coisa ou alguém
ao menos um ínfimo halo
guia os meus passos
quero escrever
em folhas de luz
E a escuridão me abençoe
Da árvore
já colheram as maçãs
o pássaro foge
voando
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10 de Janeiro 2024
não me importo
de morrer ou
de viver e desejo
viver inteira
e se morrer sou inteira
o que vale é sempre inteiro
se viver as partes
todas que me formam
e me continuarem a formar
nem um líquido as poderá separar
nem o sangue
ou as ondas do mar
nem o céu
ou a gota da rosa
os ramos que vejo
da minha janela
continuarão a crescer
no inverno de todas as vidas
até ao amanhecer
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21 de Março 2024
vejo para além
de sentimentos
indizíveis
do mastro
que se ergue
das asas
que me prendem.
Um clarão
atómico
estilhaça-me
em pedaços de nada
quero erguer-me
o deserto
transfigura-se
em lágrimas de oceanos
que se estendem
para além de lá
o lugar que não conheço
é musical
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